29/5/2009
Há alguns meses fui convidado a dar uma palestra sobre Icaros (cantos sagrados que veiculam a sabedoria curativa nos povos originários da Amazônia),
Agradeci e abri o espaço para as perguntas. Na platéia havia dois artistas desses povos originários da Amazônia, de modo que os convidei a subir ao palco para que me ajudassem a responder as perguntas do público.
Em seguida, um dos artistas presentes chamou a atenção para o valor do som em si mesmo. O poder que veicula o som. E que a gravação guardava muito da memória desse som, apontando que ele havia percebido como a voz gravada daquele xamã havia mexido com as pessoas da platéia.
Quis abrir as discussões deste espaço com esse exemplo, porque ele vai nos introduzir nas questões que podem conformar os limites e alcances de uma interface entre Psicanálise e Antropologia, e inclusive pensar numa possível Etnopsi a partir de problemáticas sul-americanas.
Nas últimas décadas o mundo contemporâneo foi tornando mais complexos os processos de subjetivação, o que fez com que a alteridade e a ética entrassem no foco do pensamento de filósofos e cientistas sociais perante fenômenos tais como: o eu, que ficou fragmentado; os movimentos migratórios, que ficaram mais intensos; a tensão global-local, que se tornou imprescindível, tanto politicamente, como na compreensão nos seus múltiples níveis - o excesso de informação e comunicação, a tecnologia ocupando cada vez mais espaço - até o ponto em que praticamente tudo na cultura é “assistido”.
Frente a tantas mudanças sociais, políticas e subjetivas, aquelas primeiras (e não tão primeiras) articulações da psicanálise sobre a cultura, a criatividade, a arte, o sagrado, a agressividade (só para mencionar alguns dos fenômenos de diferentes registros da experiência humana), ficaram não só obsoletas, mas também inapropriadas, irritando a antropólogos e grupos de direitos humanos. Podemos dizer, então, que essa interface não é tranqüila para os psicanalistas, mas, ao mesmo tempo, frente às demandas do mundo contemporâneo, não podemos nos fazer de surdos.
Na clínica observamos cada vez mais freqüentemente a dificuldade das pessoas estarem em condições de dialogar com esse outro, e ainda, com a outra cultura. Aquilo que é vizinhança se apresenta no mundo contemporâneo como o desconhecido familiar. Compreender o outro não só é difícil porque as representações que esse outro maneja são diferentes ao nosso mundo, mas, fundamentalmente, porque acessar o outro inclui um processo de subjetivação para o qual não necessariamente estamos prontos.
COMENTÁRIOS:(1)
8/9/2009 17:42:54
Nome:MARIA EMILIA MENDONCA
Site / Blog:www.ginasticaholistica.com.br
Comentário:Um comentário singelo: quem sabe ouvir o CD no qual ressoa o canto de um xamã seja o primeiro chamado para um contato mais real. Que bom te encontrar por aqui, Walter. Carinho .M E.